Nota do Grupo de Estudo de Gênero do PoliGNU sobre a “Barraca do Tapa” da Festa Junina da Poli

"Você já foi taxada de vagabunda pelos seus colegas de classe? (...)
Aquele babaca já te chamou de gorda? (...)
A sociedade te menospreza pelo simples fato de ser mulher? (…)
Se sim, saiba que nós, do CAM, incentivamos e apoiamos todos esses tipos de práticas que deixam vocês, mulheres, putas da vida."

O trecho acima fazia parte da divulgação no Facebook da “Barraca do Tapa” do CAM na festa Junina da Poli, ocorrida na última sexta-feira (17/08/12). Lembrando que o CAM é o Centro Acadêmico da Engenharia Mecânica da Poli-USP, entidade que representa estudantes dos cursos de Mecânica e Mecatrônica da Escola Politécnica da USP.

A ideia da Barraca era que mulheres pagassem para poder dar tapa na cara de homens. Como, para muitas mulheres a barraca não era atrativa, a organização entendeu que era necessário instigá-las e motivá-las a bater. Para isso, no evento intitulado “Venha bater em nossa cara” do CAM, sob o pretexto do humor, foram usadas ofensas e provocações como as acima explicitadas, que reforçam preconceitos e estereótipos a que mulheres estão submetidas cotidianamente, além de estimular a resolução violenta de conflitos.

Nenhum preconceito deve ser tolerado sobre a égide da brincadeira, visto que, num extremo não tão distante desse tipo de brincadeira, mulheres são agredidas, estupradas e até mortas. O estímulo aparentemente inocente da violência pode culminar na sua naturalização, como constatado no caso da estudante que foi agredida em maio desse ano por recusar-se a ficar com um estudante do curso de Biologia da USP.

Assim como piadas de cunho depreciativo com negros e homossexuais são apenas a expressão mais superficial de um problema social profundo, piadas machistas denotam o mesmo arcabouço cultural que propicia a violência contra a mulher, seja ela de que tipo for. A tolerância leviana a esse tipo de brincadeira é não menos do que a legitimação, a risonha anuência, a toda violência contra a mulher.

Há a percepção de que em espaços em que a minoria é mulher (no último ano apenas 16,5% dos convocados para a matrícula na Poli em primeira chamada foram mulheres) as práticas machistas encontram um ambiente mais propício para aflorarem, o que torna o ambiente menos atraente para as estudantes. Nesse contexto, observando dados no site do MIT (Massachusetts Institute of Technology), percebe-se uma maior paridade de gênero entre estudantes do que nas áreas de exatas da USP. E, para o MIT, tal informação é colocada como algo extremamente positivo e resultante de políticas da instituição nesse sentido.

Não seria a Universidade de São Paulo responsável pedagogicamente pela formação dos estudantes que por ela passam? Não seria de responsabilidade dessa mesma Universidade desincentivar o desenvolvimento de desigualdades e preconceitos de qualquer cunho dentro do seu corpo discente? Não seria ainda a USP co-responsável por uma consequente formação ética profissional capaz de desestimular essas desigualdades?

Manter uma política de silêncio e impunidade é ausentar-se de tais responsabilidades e, nesse sentido, faz-se necessário um posicionamento não apenas da direção da Escola Politécnica, mas também da Universidade de São Paulo – e é o que esperamos.

“O que me preocupa não é nem o grito dos corruptos, dos violentos, dos desonestos, dos sem caráter, dos sem ética. O que me preocupa é o silêncio dos bons.” Martin Luther King

Grupo de Estudos de Gênero da Poli

Ago/2012

 

Observação: Aqui está a nota a respeito da "Barraca do Tapa" que novamente ocorreu em Ago/2013.

Português, Brasil

Não há comentários.

Comentar

Filtered HTML

  • Endereços de páginas de internet e emails viram links automaticamente.
  • Tags HTML permitidas: <a> <em> <strong> <cite> <blockquote> <code> <ul> <ol> <li> <dl> <dt> <dd>
  • Quebras de linhas e parágrafos são feitos automaticamente.

Plain text

  • Nenhuma tag HTML permitida.
  • Endereços de páginas de internet e emails viram links automaticamente.
  • Quebras de linhas e parágrafos são feitos automaticamente.
To prevent automated spam submissions leave this field empty.
CAPTCHA
Este desafio serve para testar se você é um visitante humano e prevenir sistemas automáticos de envio de spams..