Gazeta do Povo (PR)

Fidelidade a toda prova

Levantamento com base em 92 votações em 2011 na Câmara Federal mostra que os partidos aliados acompanharam o PT, legenda da presidente Dilma, em 90% dos projetos

Publicado em 28/01/2012 | Vinicius Boreki

Um estudo realizado pelo Grupo de Estudos de Software Livre da Poli/USP (PoliGNU) analisou a semelhança dos partidos políticos com base em 92 votações de projetos em 2011 na Câmara dos Deputados. Os dados indicam que as legendas aliadas apoiaram o PT, partido da presidente Dilma Rousseff, em 90% das propostas, independentemente da ideologia política, enquanto a oposição mantém semelhança próxima a 30%. No caso do PT, base do governo, a maior proximidade foi com o PCdoB, com 97%, e a menor com o PSol (19%). Com o PSDB, principal legenda da oposição, a igualdade ficou em 25% (veja infográfico nesta página).

Mais do que comparar posições de partidos e parlamentares, o objetivo do estudo, realizado por meio dos dados abertos (um formato que permite o uso de ferramentas digitais para realizar análises), é dar ao cidadão subsídios para votar. “Há pouca informação para o eleitor. A tecnologia pode suprir essa lacuna e permitir à sociedade criar suas próprias visões dos fatos”, explica Leonardo Alexandre Ferreira Leite, estudante de pós-graduação da USP, autor do estudo e membro do PoliGNU.

Direito a informação

Tecnologia pode aumentar transparência, defende especialista

Autor da análise, Leonardo Alexandre Ferreira Leite integra o PoliGNU, grupo de estudantes que defende a disseminação e o uso de software livre e de formatos abertos, inclusive no uso de tecnologias livres, buscando aumentar a transparência nos governos. Mais do que apenas divulgar dados em sites, os integrantes do grupo defendem que o formato deve favorecer o processamento de informações. “Dependendo do tipo do arquivo, a análise é quase manual. Se forem abertos, é possível fazer comparações e análises”, esclarece Leite.

Na avaliação do cientista político Alberto Carlos Almeida, há tendência de movimentos semelhantes ao PoliGNU se multiplicarem pelo Brasil em razão da demanda por democracia. “A pressão por essa abertura de dados vai aumentar. As quedas de ministros e as denúncias de corrupção já mostram a importância dessas iniciativas e levam políticos a se comportar de forma mais regrada”, diz.

Hackers

Membro do Transparência Hacker, entidade parceira do PoliGNU, Pedro Markun afirma que a tecnologia pode ser uma ferramenta de auxílio na compreensão do sistema político. “Da mesma forma que a internet e o digital conseguiram colocar em xeque a indústria da multa e do jornalismo, ela pode sacudir o mundo político”, alega.

Embora muitas casas legislativas, prefeituras e estados desrespeitem às leis de transparência, Markun diz já existir menor rejeição à publicação de dados livres. E a própria Câmara dos Deputados é exemplo, pois pretende divulgar todas suas informações em formato XML até o fim deste ano, o que favorece as pesquisas realizadas por jornalistas, acadêmicos e a sociedade. (VB)

A comparação do PT, historicamente ligado à esquerda, com o PP e o PR, que defendem plataformas de direita, ultrapassa os 90% de semelhança. Para o cientista político Antônio Octávio Cintra, a igualdade se deve às comodidades oferecidas pelo governo. “Estar com o governo significa ter acesso a uma porção de facilidades, de empregos à liberação de emendas”, diz. “De fato, os partidos entram no jogo, especialmente para ter acesso à verba e aos cargos”, afirma Alberto Carlos Almeida, cientista político do Instituto Análise e autor do livro A Cabeça do Brasileiro. Aliás, os partidos aliados não descartam a hipótese de usar estatísticas desse tipo na barganha por cargos.

Recentemente, uma análise feita pela consultoria Arko Advice, especializada em estudos sobre o comportamento dos parlamentares, também apontou o PCdoB e o PSB como os maiores aliados do governo em 2011. Nesse estudo, a maior curiosidade ficou por conta do PSD: 94% dos deputados que participaram de votações em novembro e dezembro – o partido surgiu em outubro – apoiaram o governo Dilma. “Ficou claro que não se trata de ideologia, mas de estar a favor ou contra o governo”, diz Cintra.

Contudo, nem sempre posições idênticas à base contrariam a ideologia dos partidos. “Em alguns casos, pode haver acordo até porque o PT mudou após vencer a primeira eleição presidencial”, avalia. “O PT estatizou alguma área? Propôs acabar com a propriedade privada? Essa seria uma plataforma nacionalista da esquerda clássica, que foi abandonada há muito tempo”, acrescenta. Essa seria a explicação para as divergências de posicionamento entre PSol e PT, conforme Almeida. “[PSol] é um partido pequeno, tipicamente antissistema”, diz.

Peso

Apesar da mudança de posicionamento de legendas, Almeida afirma que, para a maior parte dos eleitores, a ideologia não é o critério mais importante na hora de votar. “O partido com uma marca clara é o PT. Eles mobilizam tanto para quem defende a legenda, quanto para a rejeição. Os demais não conseguem isso, pois o nível de identificação é muito pequeno”, afirma.

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